Desde que o Brasil é Brasil nós temos escritores negros, sejam seus trabalhos divulgados ou não. Cruz e Sousa e Machado de Assis são dois nomes que aparecem com frequência nas aulas de literatura do colégio. Mas o que muitas vezes passa despercebido é o trabalho de autores contemporâneos que resgatam e fazem história no país. Muitos deles vieram de comunidades muito pobres e superaram dificuldades e preconceitos para poder dar voz aos seus pensamentos. Hoje ainda existe a invisibilidade do negro brasileiro e a literatura de pessoas como as que estão abaixo é uma forma do Brasil olhar para si próprio, como se fosse uma instigação, uma provocação, uma descoberta.

Joel Rufino dos Santos

Historiador, professor e escritor brasileiro, é um dos nomes de referência sobre cultura africana no país. “Como tantos escritores eu tive alguém, na infância, que me viciou em histórias. Lia gibis escondido, o que, possivelmente, ampliou o seu fascínio. E a Bíblia, ao invés de tomá-la como livro sagrado, tomei-a como livro maravilhoso de histórias, e como manual de estilo”.

“O senso comum de nossa época é ambivalente com relação à ciência e à técnica. Ao mesmo tempo que acredita em suas promessas, desconfia que haverá um outro saber, mais anterior e profundo, que as cauciona e lhes estabelece limites. O homem, enquanto homem, não precisa da ciência e da técnica para existir. A existência precede as duas”. (Trecho de “Chico Xavier x Bertrand Russell”).

Elisa Lucinda

Poetisa, jornalista, cantora e atriz brasileira, recebeu o Troféu Raça Negra 2010 em sua 8ª edição , na categoria Teatro. Com mais de doze livros publicados, foi a idealizadora da Casa Poema,  instituição sócio-educativa que capacita profissionais através da poesia falada para contribuir com a sua formação cidadã. Entre suas obras, destaque para o livro infantil Lili, a rainha das escolhas, a história de uma menina negra – tão difícil encontrar referências assim para crianças.

“Ninguém na calma tarde do rio. Banho-me, disputando com os dourados cardumes de peixinhos miúdos um lugar nas águas doces. Ita-una  significa pedra preta  e tudo resulta nesta cor mate- bronze -cobre- ouro do menino rio onde brinco e com quem brinco de ir subindo êle, dando braçadas contra a  sua correnteza, e  de voltar deslizante, boiando na carona da mesma.Ninguém me vê”. (Trecho de “Rio melhor”).

Conceição Evaristo

Nasceu numa favela em Belo Horizonte e conciliou os estudos com o trabalho até concluir o curso normal aos 25 anos. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde passou num concurso público para o magistério e estudou Letras na UFRJ. Estreou na literatura em 1990, com obras publicadas na série Cadernos Negros. Suas obras, em especial o romance Ponciá Vicêncio, abordam temas como a discriminação racial, de gênero e de classe. A obra foi traduzida para o idioma inglês e publicada nos Estados Unidos em 2007.

“Em baixa voz
violento os tímpanos do mundo.
Antevejo.
Antecipo.
Antes-vivo
Antes – agora – o que há de vir.
Eu fêmea-matriz.
Eu força-motriz.
Eu-mulher
abrigo da semente
moto-contínuo
do mundo”.

Conceição Evaristo

Paulo Lins

Escritor brasileiro, ganhou fama com a publicação do livro Cidade de Deus (1997), sobre a vida nas favelas do Rio de Janeiro. Morador da favela carioca, começou como poeta nos anos 1980 como integrante do grupo Cooperativa de Poetas, por onde publicou seu primeiro livro de poesia: Sobre o sol. Fez roteiros para alguns episódios de Cidade dos Homens (TV Globo), e o roteiro do filme Quase dois irmãos, de 2004, de Lúcia Murat, que recebeu o prêmio de melhor roteiro da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA), em 2005.

“Hoje no Brasil Já existe uma maior inserção na sociedade, mas ainda há muitas dificuldades e racismo. A polícia ainda mata muitos negros, principalmente jovens. O Brasil é um país em guerra. Morre muito mais gente no Brasil do que no Oriente Médio, na briga entre muçulmanos e judeus”. (Paulo Lins em entrevista à Carta Capital).

Ana Maria Gonçalves

Escritora brasileira que conquistou o Prêmio Casa de las Américas na categoria literatura brasileira. Autora dos livros: “Ao lado e à margem do que sentes por mim” – 2002;  “Um defeito de cor” – de 2006 – obra, inspirada na vida de Luísa Mahin, conta a trajetória de uma menina nascida no Daomé e capturada como escrava aos 8 anos de idade, até a sua volta à terra natal como mulher livre.

“Acho que há um tipo muito especial de sentimento entre pessoas que não têm a necessidade de quebrar silêncios. Um pacto com a presença, apenas com a presença, sem precisar justificá-la. Embriaga-se e farta-se da presença do outro, e fica-se tão satisfeito dela que tudo mais, que todos os outros sentidos e todas as outras necessidades, tudo é adiado. Tudo cede forças para que flua melhor a dança invisível e prazerosa, quase erótica, que faz com que duas almas troquem de lugar, silenciosamente. A ponto de não saberem mais se pertencem a um corpo ou a outro. Isso acontece em silêncio e é tão natural entre duas pessoas que se amam que elas quase não percebem”. (Trecho de “Um defeito de cor”)






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