“O abismo entre gerações nos tempos atuais é o maior da história. Os jovens gostam mais das telas, onde sua desenvoltura é imbatível. Nós continuamos sendo livrescos.

Os jovens de hoje tornam-se adultos muito rápido. Em relação a sexo, por exemplo. É uma liberdade que os torna mais saudáveis do que nós fomos. Os tabus e as proibições fizeram com que o sexo fosse traumático. Os países que viveram a utopia demonstraram que ela provocava mais injustiças do que as corrigia.

Quando eu era jovem não compreendia a igualdade entre o homem e a mulher. Os jovens agora são mais conscientes disso, e nós éramos bastante cegos. O sexo os torna mais livres. Ainda que essa liberdade os faça perder, mais rápido, a inocência que pouco a pouco ia fomentando o amor e enriquecendo a relação sentimental.

Perdi a minha inocência entre os 10 e os 11 anos. Eu não sabia como as crianças vinham ao mundo; que cegonhas as trouxessem me parecia algo fantasioso; não suspeitava do tipo de vida sexual que estava na origem da procriação.

Descobrir o amor me comoveu. Foi fundamental, e o descobri antes do sexo. Meu primeiro amor foi uma trapezista de circo. Eu era muito jovem; e os circos vinham para Cochabamba para o 6 de Agosto, dia da Bolívia. Havia uma equilibrista vestida de rosa. Foi meu primeiro amor.

Talvez o meu primeiro beijo tenha ocorrido aos 12 anos. Fazíamos jogos maliciosos entre meninos e meninas. O prêmio era um beijo. O meu primeiro foi o de Teresita. Foi por isso que batizei com esse nome a protagonista do meu primeiro romance!

A utopia da minha juventude ruiu quando os países que viveram a utopia demonstraram que ela provocava injustiças piores que as injustiças que nós queríamos corrigir com as medíocres democracias.

Esta realidade democrática de hoje não apenas não é o paraíso como pode chegar a ser o inferno. Há corrupção, falta de transparência, de vitalidade das democracias, e isso leva os jovens a aderirem à indiferença e ao desprezo pelo social e pelo político; o que acho muito grave. É uma realidade do nosso tempo.

O que me surpreende quando converso com os jovens é o enorme desprezo pela política e pelo compromisso; acham que é uma perda de tempo, que todos os políticos são corruptos. Essa atitude cínica que assumem tão rápido é perigosa para o futuro da democracia, da liberdade, de tudo que nos tirou da barbárie.

É difícil convencer os jovens se o que têm é viver em sociedades nas quais não há emprego, a não ser para uma minoria. A grande revolução tecnológica transforma o mundo e faz desaparecer, cada vez mais, oportunidades de trabalho.

Há um deslumbramento com a tecnologia como panaceia para resolver tudo. Uma utopia perigosa: ameaça a maior conquista da humanidade, a liberdade. É um pesadelo orwelliano que se tornou realidade.

Uma vez eu disse que imaginava a velhice junto com um dogue alemão, de frente para o mar.Ha, ha, ha! Meu sonho é poder continuar lendo e escrevendo até o final. Se for assim, será uma morte feliz.

Acredito que o jovem do futuro seja um jovem muito bem preparado para enfrentar um futuro enormemente incerto e difícil”.

Trecho de uma entrevista com Mario Vargas Llosa extraído de El País






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