“O sofrimento pode ser um valioso meio de autoconhecimento. Portanto, observe o que ele está tentando comunicar”

A magnifica borboleta apresenta em si todas as características latentes que posteriormente serão desenvolvidas para que ela viva uma nova realidade; aquela que sempre foi inerente a sua essência.

Assim como a transformação da lagarta em borboleta é um processo lento, profundo, delicado e doloroso, onde ela irá se esforçar para libertar-se da sua condição de lagarta, achamos que os processos de transformações pessoais necessários não são diferentes e que nunca irão acabar.

A vida não é estática e está em constante mudança, nunca permanecemos os mesmos, somos sempre devir, em processo de construção continua. Porém, muitas transformações, assim como a da lagarta, trazem em seu bojo a companhia do sofrimento…

A finalidade do sofrimento

O sofrimento faz parte da condição humana, sendo as vicissitudes da vida companheiras inseparáveis de qualquer cultura, fase do desenvolvimento, condição socioeconômica, intelectual, geográfica, de gênero e época. O sofrimento esteve sempre presente no decorrer dos tempos, na nossa existência, fazendo parte de acontecimentos indesejáveis e dos reveses inesperados.

As tristezas e as dificuldades sempre se mesclaram com momentos de alegria e realizações no percurso das nossas vidas. Ninguém vive a plenitude de uma vida sem transformações e sofrimentos; e ele, muitas vezes, sorrateiro, chega de maneira inesperada, rói e corrói tudo o que parecia estar em perfeita ordem e harmonia.

Chega na surdina, onde acreditávamos que tudo estava sob nosso pretensioso controle. Muitas coisas estão sob o controle de nossas ações e cabe a nós evitarmos o sofrimento; no entanto, para outras, não possuímos este controle, o que gera impotência e angústia.

Mas será que de fato nos preparamos para as grandes transformações da vida?

Na realidade, nascemos no sofrimento e este sempre nos acompanhou, assim como os momentos felizes. O sofrimento não é a unica forma de aprendizado, mas infelizmente sempre o relegamos pelo motivo obvio de que não é agradável sofrer.

Por outro lado, não tivemos uma educação para lidar com o sofrimento. Os processos educacionais não nos ensinam metodologias eficazes de modo a explicitar sobre como retirar do sofrimento o sumo da sabedoria que as experiencias pouco felizes reportam.

Vivemos em uma cultura hedonista, dos prazeres fugazes, efêmeros e momentâneos. Devemos ser felizes o tempo todo, obrigatoriamente. Mas a lagarta em seu processo não estava feliz, ela estava enfrentando um desafio para uma nova realidade que lhe proporcionaria a liberdade. A lagarta “compreende o sofrimento”, pois “sabe” que o esforço e as dificuldades são os geradores da conquista de sua liberdade e autoconhecimento.

Sendo a vida um desfilar constante de transformações, neste baile de mascaras, percebemos e interpretamos a realidade de modo inteiramente pessoal. Muitas vezes, nos contentamos com uma realidade que não existe, repercutindo em um vazio existencial imenso. Não queremos sair de nossa zona de conforto. Não existe espaço para as grandes transformações, para o trabalho do luto, do choro, da tristeza e nem da dor, como se elas não existissem e não trouxessem sua mensagem.

Sendo a vida feita de (re) construções, de (re) avaliações, composta de alegrias, de perdas, de renascimentos e de renovações incontáveis,acredito que não estamos preparados devidamente para os revezes que porventura este cenário possa trazer.

Ter uma educação para o sofrimento não significa ser masoquista ou querer provocar o sofrimento. Significa que não podemos negar que momentos difíceis existem, que virão e que deverão ser “encarados” como desafios, de maneira inteligente e resiliente. Ter educação para o sofrimento não utiliza a metodologia do sofrer por sofrer, mas como meio de aprendizado e evolução.

Além disto é ter também direito ao nosso espaço para elaborar a própria dor dentro do tempo que se faz necessário; é desenvolver a sensibilidade, a receptividade e a capacidade de compreensão e empatia para acolher também o sofrimento do outro. Através do sofrimento bem vivenciado nos humanizamos e nos tornamos mais receptivos.






Soraya Rodrigues de Aragão é psicóloga, psicotraumatologista, escritora e palestrante. Realizou seus estudos acadêmicos na Unifor e Università di Roma. Equivalência do curso de Psicologia na Itália resultando em Mestrado. Especializou-se em Psicotraumatologia pela A.R.P. de Milão. Especializanda em Medicina Psicossomática e Psicologia da Saúde - Universidad San Jorge (Madri) e Sociedad Española de Medicina Psicosomática y Psicoterapia.   Sócia da Sociedade Italiana de Neuropsicofarmacologia e membro da Sociedade Italiana de Neuropsicologia. Autora do livro Fechamento de Ciclo e Renascimento: este é o momento de renovar a sua vida. Edições Vieira da Silva, Lisboa, 2016; e do Livro Digital: "Transtorno do Pânico: Sintomatologia, Diagnóstico, Tratamento, Prevenção e Psicoeducação. É autora do projeto "Consultoria Estratégica em Avaliação Emocional'.