Sabemos que o curso de uma vida compreende um sem-número de altos e baixos físicos e emocionais, de quedas e recomeços, de dúvidas, retrocessos e avanços. Nosso bem-estar é condicionado pelas situações com as quais nos envolvemos, quer de forma consciente e voluntária, quer acidentalmente.

Há momentos em que navegamos pela tempestade, nos quais a tensão e a dificuldade são palpáveis. Há momentos em que nos deixamos embalar pela suave calmaria; momentos em que a própria realidade parece conspirar a favor daquilo que desejamos. Há, ainda, instantes de sabor agridoce, nos quais o que separa um sorriso de uma lágrima é uma linha imprecisa e vacilante.

Reconhecemos essa dinâmica de idas e vindas como impermanência.   Impermanente é tudo aquilo que se modifica, que se transforma, que se transmuta em algo novo.  Se refletirmos, veremos que nossa existência no universo só é possível por causa da impermanência, isto é, do contínuo movimento de expansão a que ele está sujeito.

Às vezes, reconhecer esse estado de impermanência é, por si só, um desafio; posicionar-se em relação a ele de forma serena e coerente representa a odisseia humana.

A relação de dependência com o que é externo e a perda do protagonismo 

Geralmente acontece assim: se a maré está favorável hoje, nos sentimos invencíveis, ainda que ontem tenhamos duvidado de nossa coragem para enfrentar os desafios, ou questionado nossa capacidade de vencê-los. Por vezes, viajamos entre esses opostos – vamos da lama às estrelas (e vice-versa) – em um único dia.

Essa relação de dependência é natural, no entanto, deve ter limite, caso contrário torna-se prejudicial. Se passamos a associar nosso equilíbrio interno às condições externas, sobre as quais não exercemos qualquer tipo de controle, abrimos mão de nosso protagonismo.

Atribuir a responsabilidade sobre nossa trajetória a outrem, a ações alheias, significa reagir (e apenas reagir) de forma inconsciente a cada intempérie encontrada pelo caminho. Significa tatear cegamente em busca de uma solução que estará para sempre fora de alcance. 

Como podemos, então, passear pela turbulência com passos tão leves quanto quando atravessamos a plenitude?

Manter o equilíbrio em meio às oscilações

Para manter o equilíbrio é preciso primeiro encontrá-lo. E não se trata exatamente de uma caça ao tesouro, e sim de uma busca espiritual e intelectual, de um esforço consciente e continuado.

Aqui não há uma receita de bolo, uma fórmula padrão, a ser seguida. Cada um de nós funciona de acordo com um ritmo e um código e, por conseguinte, nossas verdades são únicas, irreplicáveis e precisam ser compreendidas como tal e decifradas. 

Você constrói sua base, seu ponto de equilíbrio interno à medida que se conhece, que se aceita, se respeita e se dá a chance de errar.

Quanto mais fé você tem em si mesmo, na sua essência, mais fácil será retomar o equilíbrio após a queda, a falha, a decepção. E quanto mais fluída for esta retomada, mais rápida será a catarse, a recuperação e o recomeço.

Conquistar esse equilíbrio não significa fincar-se como uma estaca, permanecendo imóvel num mundo em constante transformação, fechando-se às mudanças e repelindo as variações sensoriais. É, antes, aceitar a impermanência da realidade e aprender com suas oscilações.

Afundamos momentaneamente sabendo que logo retornaremos à superfície, e então nadaremos. Flutuamos como uma pena levada pelo vento sabendo que mais adiante voltaremos ao chão, e então caminharemos.  O segredo, grave bem, está em fazer desse movimento uma arte.  

 






Escritora, editora e fotógrafa. Formada em História pela Universidade Federal de Santa Catarina e em Antropologia pela Goldsmiths University of London. “Quando crio, busco sempre associar duas formas de linguagem: a escrita e a imagética”. Os contos Jacques, Elodie e África foram publicados na antologia Contos Fantásticos da 42, da Editora 42.