Psicologia e Comportamento

Enfrentar a depressão não é uma questão de força de vontade ou dar a volta por cima

As angústias trazidas pelo momento atual, com medo, pressão e desesperança, podem até desencadear ou reativar um transtorno depressivo. Entretanto é possível agir antes que isso aconteça. Pois, a depressão, a exemplo de tantas outras doenças, pode ser prevenida.

Estima-se que 300 milhões de pessoas vivam com depressão no mundo hoje, quase 12 milhões delas no Brasil. Aqui, aliás, a prevalência parece mais alta do que no resto do mundo — 5,8% da população é acometida.

Um levantamento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com 45 mil voluntários aponta que 40% deles se sentem tristes com frequência.

Para 2021, a Organização das Nações Unidas (ONU) projeta a maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) elenca a saúde mental como prioridade absoluta para os próximos anos e já considera a depressão a doença mais incapacitante do planeta.

Medicalização banalizada

O que tem ocorrido é uma banalização da medicalização: excesso de remédios para quem poderia se tratar com outras abordagens e a falta deles para quem realmente precisa.

“O mais difícil hoje é fazer diagnósticos precisos e entender qual é a melhor abordagem para o conjunto de sintomas daquele indivíduo”, diz o psiquiatra Michel Haddad, um dos coordenadores do Instituto Brasileiro de Farmacologia Prática.

Num tratamento é eficaz, com ou sem remédios, é possível restaurar os circuitos cerebrais e recuperar a qualidade de vida. Só que, quanto mais tempo leva para encontrar a melhor estratégia para cada um, menor a chance de sucesso e mais infelicidade no caminho. Quanto antes começar o tratamento é melhor, mas é justamente nessa fase que a medicação pode ser prescrita sem necessidade. Sendo assim, a melhor abordagem, a princípio, é sempre a psicoterapia.

Enfrentar a depressão não é uma questão de ter força de vontade ou mudar de vida

“Nos últimos 50 anos, o discurso de que a depressão é um problema biológico se tornou hegemônico, o que leva à ideia de que nosso modo de vida e a maneira de lidar com as emoções nada têm a ver com isso”, argumenta o psicólogo Christian Dunker (capa), da Universidade de São Paulo (USP).

“Hoje estamos diante de um impasse”, avalia Dunker. Medicamentos têm o seu lugar e são necessários em muitas situações, e até o tabu em relação a eles precisa ser cutucado.

Mas a doença não se resolve apenas instigando neurotransmissores ou desligando áreas do cérebro. Assim como enfrentar o “mal do século” não é uma questão de ter força de vontade ou mudar de vida.

É ao equilibrar essas duas visões e superar certos paradigmas que poderemos nos sair melhor da epidemia de depressão. Ela existe, não escolhe sexo, bolso ou idade e, se não cuidada, pode ser fatal.

Portal Raízes

As publicações do Portal Raízes são selecionadas com base no conhecimento empírico social e cientifico, e nos traços definidores da cultura e do comportamento psicossocial dos diferentes povos do mundo, especialmente os de língua portuguesa. Nossa missão é, acima de tudo, despertar o interesse e a reflexão sobre a fenomenologia social humana, bem como os seus conflitos interiores e exteriores. A marca Raízes Jornalismo Cultural foi fundada em maio de 2008 pelo jornalista Doracino Naves (17/01/1949 * 27/02/2017) e a romancista Clara Dawn.

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