Oi. Tudo bem com você? Desculpe aparecer assim sem avisar, mas, preciso lhe pedir perdão e isso não pode esperar. Eu sei, faz muito tempo que a gente não conversa, estou muito constrangida. Me perdoe, por não ter percebido, o quanto eu lhe abandonei, lhe deixei sozinha no escuro, achando que poderia seguir em frente sem você.
Perdoe-me por ter esquecido que você é pessoa mais importante da minha vida. Pode não parecer, mas, eu amo você, apesar de nunca lhe provar isso. Eu sinto tanto!, acredite. Eu confesso que, embora eu estivesse sentindo a sua falta, só hoje me dei conta de que você não estava mais aqui. Eu não lhe vi partindo. E penso que isso aconteceu porque aos poucos eu fui lhe abandonando, lhe deixando pra depois. Pra depois, pra depois… Sempre depois, nunca agora. E você se cansou de mim, eu sei.
Eu estava ocupada demais lambendo as feridas que os outros me causaram, e sem perceber, acabei lhe ferindo mais do que os outros me feriram. Eu gastei noites a fio, sem conseguir dormir, tentando revolver problemas que não foram criados por mim; querendo entrar em portas que só se abrem de dentro para fora; desejosa de proteger e ajudar outros amores, e me esqueci de você.
Mas hoje aconteceu algo que me fez perceber que sem você eu não existo. Sem você, eu sou nada. Sem você eu sou incapaz de proteger, amar, aconselhar, ouvir, buscar, ensinar, aprender… Enfim, sem você, sou ninguém.
Não me olhe assim… Eu sei que estou um tanto atrasada, mas espero que ainda dê tempo de lhe dizer que errei. Demorei muito? Você me ensinou que nunca é tarde para se pedir perdão, para admitir os próprios erros e assumir consequências. Então, assumo, errei. Perdoa-me!
Abraça-me, Volte pra casa. Vamos ouvir as musicas que a gente gosta. Porque faz tempo que Ana Carolina, não faz café sem açúcar, nem joga pedra na janela. A Adriana Calcanhoto, não buscou a foto, nem as chaves de casa que ela perdeu, e pra variar ainda foi embora no carro sem freio. É sério, o Ira, não dançou mais com a Pitty.
Sem você aqui, o Roupa Nova, envelheceu. Os Engenheiros do Hawaii? Sei lá, seguiram pelas curvas infinitas da Highway, e provavelmente se embriagaram de vinho barato num bar qualquer, ou estão ‘nadando contra a corrente, cantando lá, lá, lá, desafinados e contentes’. Isso aí no canto da boca foi um sorriso? Tá vendo, eu sempre soube como lhe arrancar sorrisos. Na verdade, uma vez você me disse que eu sou única capaz de fazer isso com honestidade.
Mas falando sério, se você não voltar, Oswaldo Montenegro não verá a bailarina dançando bandolins, não vai namorar a Madalena à beira do mar. A porta da alegria não se abrirá e aquela lista que a gente nunca concluiu? Sozinha eu não consigo. Nossa playlist precisa ser ouvida por nós.
Para ser sincera, eu não espero que você me perdoe. Afinal de contas, tantas vezes eu perdi a calma ao ponto de lhe odiar e até desejar que você deixasse de existir. Mas, por favor, tenha boa vontade para enxergar, além das entrelinhas, aquela luz linda que irradia os nossos olhos quando estamos em sintonia. Por favor, volte para casa.
Vou cuidar dos meus cabelos com hidratante, corte, tintura… tudo que você gosta em mim. Vou deixar as unhas crescerem novamente só para usar aquele esmalte cor de café, ou vermelho intenso, que você sempre diz que realça as minhas mãos. Vou usar aqueles brincos coloridos, grandes, ou os pequenos, e também os anéis que estão guardados a tanto tempo.
Olha como eu fiquei longe de você. Nem soube me cuidar. Dormi demais, comi errado, não me exercitei, fiquei toda travada e dolorida. Tudo isso porque eu deixei você partir. Como pude fazer isso? Como fui capaz de lhe abandonar? Logo você, a pessoa mais importante da minha vida. Eu nem sei mais, a quanto tempo, eu não me enfeito. Aquele perfume que você adora, sequer foi aberto. A nossa casa nem tem mais seu cheiro, nem me lembro da ultima vez que comi a nossa comida predileta.
Mas isso muda hoje. Só depende de você voltar para casa. Não lhe prometo, não errar de novo, mas prometo que lutarei para não falhar mais com você. Você está me perguntando, por que, só agora, por que, justo hoje.
Eu conto. Sabe aquele moço que costumava cuidar do nosso jardim? Ele reapareceu aqui hoje, olhou para mim por várias vezes em silêncio. E depois perguntou por você. Disse que quando o portão se abriu e ele não viu você, achou estranho. Olhou outra vez para mim e, encabulado, perguntou para onde você se mudou.
Depois que ele foi embora, ainda me sentindo desconfortável com a reação dele, percebi que, de fato, você não estava mais aqui. Olhei no quintal, no nosso jardim abandonado, corri pela casa e não lhe encontrei. Foi então que ao passar pelo corredor, me deparei com o espelho e me senti obrigada a encará-lo com sinceridade. Assim, percebi que o jardineiro tinha toda razão: a pessoa que abriu o portão para ele hoje, não era você. Porque você, maltratada por mim, foi embora. Você, a mulher que eu sou, não mora mais em mim. Perdoa-me!, e volta pra casa.
Texto de Helena Miranda, advogada, pós graduada em Direito Tributário pela PUC-Goiás; Especialista em Direito Civil, Processual Civil com ênfase em Direito de Família e Sucessões. Atua em Goiânia – Goiás e é colunista no Portal Raízes.