Featured

A atual geração de jovens será conhecida como a que fez o que ao mundo?

O desconforto com o mundo não atinge do mesmo modo jovens e velhos. A minha geração tinha uma causa: acabar com a opressão. Dos 20 anos aos 30, sob a ditadura, queríamos democracia, liberdade de expressão e de culto, desejávamos escolher os próprios caminhos, uma sexualidade nada amarrada, uma conduta feminina que não fosse secundarizada.

A geração atual não vive esses bloqueios nem tem grandes batalhas. A maior das batalhas hoje é a ambiental. Mas não interessa tanto aos novos, porque a minha geração não ‘erotizou’ a ecologia. Conseguimos erotizar um jeans, um carro, uma balada, uma cerveja… Mas não a causa do meio ambiente. Ela não se tornou um desejo.

A juventude não se preocupa com o fim dos recursos naturais

Eles deveriam pensar nisso. Mas é uma causa abstrata. Ninguém via o problema da água até poucos meses atrás. Agora temos que tomar providências. A ecologia fala de algo que ao jovem não interessa, que é o futuro. Essa não é uma má geração, ao contrário, tem senso de urgência, é criativa e disponível para uma série de interfaces.

Mas vive o dia como se fosse o único. Por quê? Os mais velhos disseram a eles: “Vocês não terão futuro, não haverá emprego, ar puro, segurança”. Os mais velhos também vivem repetindo que esses mesmos jovens não tiveram infância porque não souberam brincar e não subiram em árvores como eles.

Ora, quem acredita que não tem futuro nem teve passado, só enxerga a alternativa de viver o presente até o esgotamento. “Aproveite o dia”, é o lema atual. Entretanto, grandes causas como o fim da homofobia e da violência doméstica, demoram. Leva-se tempo para conquistá-las.

A atual geração de jovens adultos será conhecida como a que fez o que ao mundo?

A família precisa evitar ser geradora contínua de consumismos, impedindo que a criança ou o jovem exija um tênis que custa o preço de dois pneus de um carro, ou uma calça que tem o mesmo preço de uma televisão de 42 polegadas. Não se deve admitir que uma criança confunda desejos com direitos!

A escola e a família, evidentemente, têm uma responsabilidade em relação a isso. Há uma necessidade de olhar essas gerações que aí estão e pensar que parte delas não tem a ideia do que é o esforço. Tem menino de 20 anos que, como disse, nunca lavou uma louça, jamais arrumou uma cama. Na Alemanha e nos Estados Unidos, o menino lava a louça, retira a neve, corta a grama mesmo se for filho do presidente de uma multinacional. São sociedades do esforço.

Há uma sociedade cada vez mais mais frouxa na forma de comunicação com seus filhos. Isso nos coloca numa rota a ser pensada. Nós temos uma grande questão na vida, que um dia foi colocada por Pierre Dac (1893 – 1975), ator do cinema francês do século XX, que disse: “o futuro é o passado em preparação”. Por isso, qual passado que vamos ter daqui a 20, 30 anos? Qual é o nosso legado? A atual geração de jovens será conhecida como a que fez o que em relação ao mundo, aos outros, à História, à convivência, às comunidades? Nós temos um sinal claro, hoje, de ensandecimento em várias áreas da nossa convivência.

A família tem sinais de enlouquecimento. Aos sábados, famílias inteiras saem de casa para ir a um restaurante para comer “comida caseira”. À tarde, pais e mães levam os seus filhos em festa num bufê infantil, que é um lugar para fazer festa fora de casa. Dessa forma, as crianças passam a ter clareza de que o melhor lugar, mais alegre, é aquele fora de casa. Cuidado. Estamos criando uma geração de robôs. De autômatos.

1ª e 2ª partes é um excerto de uma entrevista com o professor Mario Sergio Cortella à Patrícia Zaidan, redatora chefe da Revista Claudia. 3ª parte é um excerto do Livro: Educação, Convivência e Ética – Mário Sérgio Cortella. Páginas 96 a 99. Cortez Editora, São Paulo- SP

Portal Raízes

As publicações do Portal Raízes são selecionadas com base no conhecimento empírico social e cientifico, e nos traços definidores da cultura e do comportamento psicossocial dos diferentes povos do mundo, especialmente os de língua portuguesa. Nossa missão é, acima de tudo, despertar o interesse e a reflexão sobre a fenomenologia social humana, bem como os seus conflitos interiores e exteriores. A marca Raízes Jornalismo Cultural foi fundada em maio de 2008 pelo jornalista Doracino Naves (17/01/1949 * 27/02/2017) e a romancista Clara Dawn.

Recent Posts

“A gente adoece mesmo é de ter que perdoar, conviver e pedir a benção para abusador”

Se nós somos aquilo que comemos e a maneira que comemos, quer dizer que tudo…

18 horas ago

“Como viver a maternidade sem culpa e sem o mito da perfeição” – Análise de dois livros de Marcia Neder

A escritora e psicanalista Clara Dawn, faz uma síntese de dois livros da doutora em…

2 dias ago

Médico de Harvard ensina a Técnica “4-7-8″ que faz dormir em 1 minuto

Dormir em um minuto? Parece que estamos mentindo, mas a boa notícia é verdadeira. Chama-se…

2 dias ago

Às vezes precisamos nos desligar do mundo e aumentar o volume da própria vida – Ophah Winfrey

Eu quero falar com você sobre o tempo de ficar só e de se dedicar…

7 dias ago

Medo, culpa, solidão e estresse: as 4 dores que as mães enfrentam diariamente – Por Léo Fraiman

As frequentes demandas, a falta de uma rede apoio, o descanso, a má divisão das…

1 semana ago

Site mobile ou app de apostas: qual é melhor para apostar

A experiência mobile para apostas levou o setor para outro nível de imersão e interatividade.…

2 semanas ago