A páscoa já passou. O dia das mães também. O dia dos namorados se aproxima e logo o inverno chegará, e estaremos de férias. Espera. Volta a fita. Já é meados de 2020 e ainda estamos na pandemia de coronavírus. Passou tanto tempo, mas não passou tempo algum. Tudo parece igual. Igual de jeito ruim. Estamos todos á mercê da sorte. O mundo inteiro se encontra virulento e a esperança declina sempre no acréscimo das vítimas do coronavírus.
O isolamento social é a principal recomendação das autoridades de saúde, no combate á Covid-19. Mas como superar a desesperança, o medo e a ansiedade quando é preciso sair e lidar com pessoas indiferentes, que não cumprem o distanciamento social e tampouco usam máscaras?
Tais necessidades, no entanto, impuseram uma mudança radical no estilo de vida das pessoas. Somando-se ao medo de ser contaminado, à impossibilidade do contato físico, entre outros fatores, a situação acaba trazendo transtornos também à saúde mental de todos, desde ás crianças até os idosos, sem distinção de classe social, gênero ou raça.
O que já era terrível antes, tornou-se muito maior durante o período de isolamento: mais violência doméstica, mais crianças abusadas sexualmente por pessoas delas próximas; o índice de pessoas abaixo da linha da pobreza cresceu exponencialmente. A pandemia trouxe à lume as realidades do mundo. Revelou-nos desprovidos de empatia, justiça social, amor, e equidade. Descobrimos a verossimilhança do que descreveu Nietzsche: “o homem é um rio poluído. É preciso ser um mar para, sem se poluir, poder receber um rio poluído”.
O isolamento social, o desemprego, o caos no sistema de saúde, a crise política, a crise econômica, a fome, a peste, as fake news, as picuinhas políticas, a guerra entre negacionistas e crédulos, as falsas esperanças, as brigas domésticas, o terrorismo psicológico, boletos vencidos, despensa vazia, o amanhã vazio…
A simples ida ao supermercado tem o poder de instaurar uma sensação de pânico em nós, ainda que o fato de poder ir ao supermercado seja um privilégio, num mundo onde mais de 820 milhões de pessoas não têm o que comer. Entretanto, a ansiedade, o medo e a aflição, não são racionais, começam na porta do supermercados, nas longas filas do lado de fora, quando os pensamentos dão um nó na lucidez: ‘e aquele sujeito ali sem máscara, quem ele pensa que é para expor os outros á contaminação?’ – ‘será que higienizaram esse carrinho direito?’ – ‘e se alguém sabendo que tem vírus estiver por ai, espirando nas coisas de propósito?’ – ‘olha aquela mulher tirando a máscara para fumar’ – e aquela outra com o nariz de fora’ – ‘e essa agora, meus olhos estão coçando, os óculos estão embaçados e tenho a sensação que o vírus passeia pelas vias respiratórias’ – ‘lá vem o seu Agenor, por favor, não fala comigo, não fala…’
Ora, há de se dar respeito ao medo e também a ansiedade. Ambos – a priori – têm relevâncias bastante positivas. O medo nos envia sinais de alerta: a pupila dilata, o coração acelera, a respiração fica ofegante, as mãos ficam trêmulas e o suor é fluente; um aperto no coração e uma angústia iminente de que algo muito ruim acontecerá. Pessoa alguma conhece a extensão de sua coragem se não colocá-la à prova… Para isto temos dentro de nós, uma reserva insuspeita de energias. Nessa hora o cérebro nos passa a mensagem de que a coragem não está na pseudo-utopia do agir sem medo e sim em comportar-se de modo preciso e consciente diante do que lhe assusta, antes que o que lhe assusta, lhe faça refém.
A ansiedade – não patológica – pode funcionar como válvula de escape da possível situação geradora de medo. Nesse caso específico do período de isolamento social, a ansiedade faz com a nossa saída de casa seja mais rápida possível e assim, para que ela se finde, aceleramos as compras, as conversas, as paradas… a fim, é claro, de evitarmos que o medo nos faça refém.
Para tornar o isolamento tolerável é muito importante construir uma nova rotina, não ficar de pijamas, e buscar atividades lúdicas e criativas, como pintar, organizar fotografias, leitura, ouvir música, e manter atividade física, e se mantenha conectado com amigos e familiares. Mande áudio, verbalize sempre, não se cale. Fale, fale. Falar cura. Cantar e dançar o faz se manter curado.
Entre tantas histórias de mortes, as consequências psicológicas causadas pela pandemia de coronavírus tendem a se tornar cada vez mais evidentes e podem aparecer meses após o ocorrido. São três os grupos mais afetados: os que perderam entes queridos, os que atuaram diretamente no combate, e os que foram impactados severamente pela crise econômica. Estes estarão sujeitos a desencadearem a depressão, o abuso de substâncias químicas, e alguns ainda optarão pelo autoextermínio.
As reações emocionais negativas da pandemia são normais, mas preocupa quando o foco de apreensão expande os limites relacionados com a pandemia, ela invade outras faces da vida como a familiar, conjugal e profissional. Entretanto, quando a pandemia acabar, não estaremos mais vivenciando toda essa situação de estresse, e o organismo voltará ao seu equilíbrio natural. Estas são afirmações de especialistas em grandes catástrofes. Os primeiros 90 dias são mais difíceis, mas o cérebro logo se movimenta para avançar no que é chamado Lei da Sobrevivência, na resiliência humana, na infinda capacidade dos seres de ressignificar as suas angústias e reinventar o sentido da vida. Passado esse período de 90 dias, se os sintomas da ansiedade e/ou depressão não desaparecem, e começarem a afetar a funcionalidade integral de sua vida, é sinal que você precisa da ajuda de um profissional da saúde mental.
A esperança, escreveu Franz Kafka, é mais útil do que a realidade. Devemos praticar a esperança: aquela coisa brilhante em nossa Caixa de Pandora, recheada de coisas ruins. Em tudo, em todo o tempo, pratique a esperança. Como? Aproveitando as benevolências do dia, o tempo – faça chuva ou sol, as boas relações, as belezas naturais e artísticas, o riso, o encantamento, o espanto diante do belo, do simples, das crianças e dos animais.
Amanheceu. É segunda. E amanhã também. Ou será que é terça? Será que já estamos no Natal, ou será daqui um mês? Será que ainda falta muito para 2021, ou ele já passou? Não faz mais diferença. Hoje é hoje. E amanhã também é hoje. Todo dia é dia luta. O que é, tem muita força de ser. Se assim é, assim será? Amanhã, será? Amanhecerá? Para que servem as notícias de ontem e as chuvas de amanhã, quando um hoje amanhece do lado de fora da janela lhe chamando para amar a Vida?
Este texto é de autoria da escritora, psicopedagoga e psicanalista Clara Dawn – Exclusivo para o Portal Raízes. É proibida a reprodução parcial, ou total, sem a nossa prévia autorização.(Lei Nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998).
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