Jane Fonda atravessou mais de seis décadas públicas sendo atriz, ativista, mulher em reconstrução. Nesse percurso ela reaprendeu feminismo, reinventou o autocuidado e transformou o envelhecimento numa prática política e amorosa. O que suas falas nos oferecem, e o que interessa ao Portal Raízes, é uma síntese útil: não se trata apenas de “dicas de celebridade”, mas de uma ética de vida que articula corpo, palavra e compromisso com o mundo. Nas linhas que seguem, exploramos quatro eixos centrais extraídos de entrevistas e manifestações públicas de Fonda: condição feminina, autocuidado, envelhecer e amor à vida.
Jane Fonda narra sua própria formação como um processo de “dupla imagem”: adaptar-se ao olhar alheio, esconder partes autênticas do eu para caber em papéis sociais. Ao longo do tempo ela converteu esse constrangimento em consciência política: “mulheres são o núcleo da questão”, escreveu ao reconhecer o feminismo, tardio mas contundente. Sua experiência aponta para algo psicanalítico e coletivo: a libertação individual passa pela tradução em solidariedade feminina, apoio mútuo e reconhecimento do próprio desejo.
Fonda é também ícone do autocuidado que não é vaidade, mas disciplina e respeito pelo organismo: exercício, movimento diário, atenção às limitações e adaptação: “faço tudo que fazia, só mais devagar”, ela diz — traduzem uma ética de continuidade. Para ela, autocuidado é ferramenta de pertencimento ao próprio tempo vital: cuidar do corpo é conservar a possibilidade de agir, de amar, de resistir. Esse discurso transforma rotinas (caminhar, manter força e flexibilidade) em rituais de preservação.
Fonda desafia a narrativa cultural do declínio inevitável. Em entrevistas e em vídeos, ela ecoa pesquisas (como estudo de Yale) que associam visão positiva do envelhecimento a mais anos de vida. Para ela, envelhecer é – em grande parte – negociável: escolhas de movimento, sentido e atitude reorganizam a experiência do tempo. Assumir a própria idade sem esconder é também um ato político contra a invisibilização das mulheres maduras.
Mesmo após enfermidades (como o relato público sobre um câncer), Fonda declara estar “mais feliz do que nunca”. Esse amor à vida aparece como surpresa agradecida: “eu me belisco: não acredito que cheguei aqui”, e como prática: engajamento político, criação artística e manutenção de laços sociais constituem sua fonte de vitalidade. O amor à vida, então, não é apenas sentimento: é um modo ativo de existir.
Em seu livro: “O Melhor Momento”, Jane Fonda transforma o próprio envelhecer em roteiro de reinvenção. Longe de ser um manual de autoajuda, o livro é uma espécie de autobiografia consciente: um mergulho na vida de uma mulher que ousou olhar para si sem medo do tempo. Nele, Fonda defende que envelhecer não é o fim de uma trajetória, mas o início de uma fase mais lúcida, amorosa e politicamente ativa. Ela fala sobre o corpo como morada sagrada, sobre a importância de cuidar-se não por vaidade, mas por respeito à própria vitalidade, e sobre o ato de continuar amando a vida como resistência à cultura que tenta apagar as mulheres maduras.
Ao longo das páginas, a atriz e ativista propõe uma reflexão que vai além da estética: trata-se de reconciliar-se com a própria história, aprender a habitar o tempo com gratidão e transformar o autocuidado em um gesto de liberdade. Em sua voz madura e afetuosa, Jane Fonda nos convida a fazer da passagem dos anos um ato político de amor e consciência.
Com base no livro: “O melhor momento”, veja abaixo 7 conselhos de Jane Fonda para envelhecer com potência emancipatória:
1. Movimente-se todos os dias, respeitando limites: mantenha a sua força vital, flexibilidade e rotina de exercício adaptada. O corpo em movimento renegocia vínculos com a desamparo e reforça a sensação de agência.
2. Reveja o significado do envelhecimento e mude a narrativa interna: adote leituras e grupos que valorizem longevidade ativa; rejeite a estigmatização. Reconstruir o “eu envelhecido” ajuda a desmentir projeções culturais de perda.
3. Faça do autocuidado uma disciplina ética, não um luxo: priorize sono, alimentação, exames e cuidados médicos; rotina é revolução. Autocuidado sustenta a capacidade de transferência: estar inteira para com os outros.
4. Não tenha vergonha em aprender tarde, porque nunca é tarde para aprender. Se reinventar é legítimo em qualquer idade; buscar novas políticas e saberes é vital, pois permite a elaboração de perdas e ganhos na trajetória.
5. Cultive solidaridades femininas e apoios verdadeiros: participe de redes, grupos, encontros que celebrem a experiência feminina. A cura passa por espelhos reais. Outras mulheres que a validam como um ser integral.
6. Transforme adversidades em combustível ético: canalize desafios pessoais em ação criativa ou voluntariado. Isso nos dá sentido, significado, simboliza perdas e cria novas narrativas.
7. Celebre a vida com gratidão prática (e sem culpa): reconheça pequenas alegrias; registre-as; permita o riso e a surpresa. A gratidão reconecta o sujeito ao presente e reduz sintomas de melancolia.
Jane Fonda nos ensina uma lição dupla: primeiro, que envelhecer não é apenas um processo biológico, mas um campo de sentido; segundo, que o corpo cuidado e a voz política se sustentam mutuamente.
Para a mulher madura, a promessa radical é esta: assumir a própria história: com rugas, cicatrizes e desejos antigos, é tornar-se sujeito político de si mesma.
Há uma dimensão psicanalítica aqui que interessa profundamente ao Portal Raízes: o trabalho introspectivo (elaboração das perdas, reverência às feridas) e o trabalho coletivo (solidariedade, ativismo) se respondem. Amar a vida, como pratica Fonda, é dizer sim ao presente apesar dos fantasmas do passado e das expectativas culturais. É, em suma, resistir com ternura.
As citações e ideias do artigo foram extraídas das seguintes entrevistas e materiais públicos com Jane Fonda:
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