Qual é o papel do pai no desenvolvimento da criança? Na psicanálise, a figura paterna não é apenas o pai biológico, mas um representante simbólico da Lei, da cultura, da alteridade e da possibilidade de separação. Desde Freud e Lacan, compreende-se que o pai, em sua função simbólica, é quem introduz a criança no mundo social, fora da fusão com a mãe. Ele inaugura o “não tudo”, o limite, a diferença, o desejo.
Contudo, a cultura patriarcal distorceu essa função simbólica e a transformou em poder, dominação, ausência emocional e distanciamento afetivo. Durante séculos, o “pai” foi o chefe, o provedor, o temido. Sua presença afetiva não era esperada, nem cultivada. O afeto era responsabilidade exclusiva da mãe — a mulher — que também carregava sozinha o trabalho doméstico e o cuidado com os filhos.
Hoje, vivemos um tempo de revisão desses símbolos arcaicos. Muitos homens estão sendo chamados — por seus filhos, por suas companheiras, pela própria sociedade — a se tornarem pais reais, afetivos, cuidadores, presentes. A função paterna está deixando de ser autoritária para se tornar participativa, horizontal, ética e amorosa.
O pediatra e sanitarista Daniel Becker, um dos maiores defensores da paternidade ativa no Brasil, alerta que a sociedade atual não tolera mais o pai que só “ajuda” , mas exige um pai presente.
“O pai não ajuda. O pai exerce sua função. O pai está presente. Ele troca fraldas, lava louça, dá banho, acorda de madrugada, educa, ama, leva ao médico, cozinha, bota pra dormir, conta histórias. Ele está lá. Presente, inteiro.
Essa afirmação desnaturaliza a ideia de que o pai é um “coadjuvante”, e convida à revolução íntima e cotidiana da paternidade.
Daniel Becker propõe uma reflexão sobre a paternidade contemporânea e a importância de os pais estarem ativamente envolvidos na vida de seus filhos. Becker dialoga sobre um modelo de paternidade afetuosa, participativa e responsável, indo além da figura do pai que apenas “ajuda” nas tarefas domésticas ou que assume um papel secundário na criação dos filhos.
O pediatra critica a ideia tradicional da paternidade como um papel de provedor financeiro e disciplinador autoritário, e a substitui por uma paternidade mais humanizada, sensível e igualitária. Para Becker, o pai presente não se limita à presença física, mas deve se envolver emocionalmente, afetivamente e nas atividades cotidianas, como as tarefas domésticas, os cuidados com a saúde e a educação.
Inspiradas nas falas e saberes de Daniel Becker, aqui estão 10 formas práticas dos pais se tornarem membros produtivos e afetivos na vida doméstica e na criação dos filhos:
1. Compartilhe as tarefas domésticas sem ser chamado — a casa é de todos, a responsabilidade também.
2. Cuide da saúde emocional e física dos filhos — leve ao médico, converse sobre sentimentos, acolha as dores.
3. Participe das rotinas escolares — ajude nas lições, vá às reuniões, celebre conquistas.
4. Aprenda a cuidar sozinho — troque fraldas, embale o sono, dê banho, sem depender da presença materna.
5. Seja afetuoso em público e em casa — abrace, elogie, diga “eu te amo”.
6. Dê o exemplo — crianças aprendem mais pelo que veem do que pelo que ouvem.
7. Esteja presente no cotidiano — no café da manhã, no jantar, nos momentos simples.
8. Converse com a parceira sobre a divisão de tarefas — com sinceridade, escuta e comprometimento.
9. Permita-se errar e aprender — não há perfeição na paternidade, há construção e reparação.
10. Eduque para a igualdade — mostre às filhas e aos filhos que o cuidado é humano, não feminino.
Se a função paterna é símbolo de limite e transmissão da cultura, que essa nova cultura seja a da escuta, do cuidado e da equidade. Os homens precisam desconstruir as masculinidades tóxicas e as heranças do machismo, não apenas por si, mas pelas mulheres com quem vivem e pelas crianças que educam.
A urgência dessa mudança não é apenas afetiva, é social, política, civilizatória. Para que nossas filhas e nossos filhos não precisem repetir nossas lutas, mas inaugurem outras, mais leves, mais justas, mais livres
“Vamos falar de uma relação muito importante e variável que talvez não varie tanto de acordo com classe social. O papel do pai vem se firmando como importante, sendo reconhecido cada vez mais; creio até que já ultrapassamos aquela fase em que dizíamos: “Que bom que o pai ajuda, que bom que essa mulher deu sorte de ter um marido que também ajuda em casa, que ajuda com as crianças”.
Ninguém deve ajudar em nada, mas, sim, dividir o trabalho. Ninguém tem que trabalhar mais ou menos e o outro ajudar: deve-se dividir as tarefas. É mais do que obrigação do homem dividir as tarefas domésticas com a esposa e, especialmente, dividir, com a mesma, as tarefas do cuidado com o filho. Com exceção da amamentação, todas as tarefas podem ser compartilhadas.
Portanto, não existe mais o pai que ajuda: existe o pai presente e a mãe presente que trabalham juntos pelo bem da família e pelo bem da criança”.
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