Categories: FeaturedPais e Filhos

Pais sem autoestima: Viver só para os filhos é infantiliza-los até a vida adulta

Uma das lições mais ásperas e ingratas da paternidade e da maternidade é que não se deve amar o filho mais do que a si mesmo. Deve-se lutar contra o excesso de amor dedicado aos filhos, para que não os sufoque e passe dos limites, para que não induza ao engano da sobreposição de sentimentos.

Porque é comum, sendo pai e mãe, sendo responsável, colocar o filho acima das vontades e se deixar por último, para atender primeiro àquele que depende da proteção. Só que exclusividade não é cuidado, é anulação da personalidade. A fórmula não tem como funcionar, apesar das sinceras e boas intenções. Depois que se vive pelo outro, não há mais como saber viver sozinho.

O ninho fica em cima de uma árvore, portanto a prioridade é a árvore. Perigoso um tronco que não se sustenta: quebradiço, fraco, de raízes rasas. Os pais necessitam de conteúdo emocional independente, de ocupações e desejos além da sua prole, para não tomar os sonhos emprestados. Que tenham os seus problemas, as suas preocupações, as suas dúvidas, os seus objetivos, a sua privacidade, as suas neuroses, as suas soluções.

Quando colocam na cabeça que são capazes de fazer qualquer coisa pelos filhos, estão agindo de modo errado por supostos motivos nobres. Mas assim, os pais indicam que a realidade deles não possui valor algum.

Os pais, pelo voluntário sacrifício, dão o exemplo de que não gozam de importância nenhuma. Acabam, sem querer, inspirando o filho a não se valorizar. Os efeitos colaterais do zelo excessivo (e da consequente falta de autoestima) é infantilizá-lo para sempre. Mesmo adulto, ele é enxergado como uma criança indefesa e inadequada para os desafios da responsabilidade.

O rebento não evolui emocionalmente, permanecendo como única fonte de alegria. Assim como também não é permitido que sofra, fazendo-o perder o protagonismo das cicatrizes e adversidade. Ele adoece para o convívio, sem obter a contrapartida da sabedoria e os anticorpos das desilusões.

Viver para os filhos já é preocupante. Viver só por eles é completamente assustador. Pois não existe discrepância entre o que é externo e interno, entre a prevenção e a fobia. Tudo é sentido embaralhado, como se fosse na própria pele. Os conselhos ficam intoxicados pelo medo de que algo de ruim aconteça, e nem os pais e nem os filhos têm tranquilidade para cumprir as suas individualidades. A herança que se deve passar adiante é amar o filho tanto quanto ama a si mesmo.

Texto do escritor Fabrício Carpinejar

Portal Raízes

As publicações do Portal Raízes são selecionadas com base no conhecimento empírico social e cientifico, e nos traços definidores da cultura e do comportamento psicossocial dos diferentes povos do mundo, especialmente os de língua portuguesa. Nossa missão é, acima de tudo, despertar o interesse e a reflexão sobre a fenomenologia social humana, bem como os seus conflitos interiores e exteriores. A marca Raízes Jornalismo Cultural foi fundada em maio de 2008 pelo jornalista Doracino Naves (17/01/1949 * 27/02/2017) e a romancista Clara Dawn.

Recent Posts

O açúcar é como o álcool para crianças, danifica o fígado e o cérebro

Os pesquisadores demonstraram que o açúcar consumido pelos pequenos pode fazer tão mal ao fígado…

3 dias ago

Como os casinos online imitam o luxo dos estabelecimentos físicos

Os casinos online avançaram muito para além de interfaces simples e poucos recursos. Hoje, os…

5 dias ago

11 feridas que a filha não amada por sua mãe carrega até a vida adulta

A relação entre mãe e filha é um dos vínculos mais profundos e complexos na…

1 semana ago

Depois dos 50 é preciso tomar a vacina contra o herpes-zóster

Herpes Zoster é uma doença que aparece na pele, causada pelo Vírus Varicela-Zoster (VVZ), o…

1 semana ago

“Quanto mais inteligente é uma pessoa, menos sociável ela é”- Por Leandro Karnal

O professor Leandro Karnal, no vídeo “Ler é viver”, reflete sobre a relação entre cultura,…

2 semanas ago

“É através do brincar livremente que a criança elabora angústias primitivas e organiza sua vida emocional” – Melanie Klein

Em uma época em que as telas dominam o cotidiano, as crianças estão gradualmente desaprendendo…

2 semanas ago