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“O feminismo incomoda mais do que o feminicídio porque a ideia de uma mulher morta é mais tolerável do que a ideia de uma mulher livre”

Desde que o Brasil tipificou o feminicídio em 2015, a violência letal contra mulheres deixou marcas que não se apagam nos números nem nas famílias. A série histórica dos últimos anos mostra crescimento e consolidação de um problema estrutural: em 2024 o país registrou cerca de 1.492 feminicídios e números recordes de estupro e violência sexual, e em 2025 os relatórios oficiais e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mantêm o alerta de uma média de quatro mulheres assassinadas por dia — um patamar que autoridades e movimentos definem como emergência. Pesquisa e relatórios apontam também que a maioria das vítimas é jovem, negra e foi morta dentro da própria casa, muitas vezes pelas mãos de parceiros ou ex-parceiros.

Este quadro não é só estatística; é expressão de um racismo e de um patriarcado que atravessam dispositivos jurídicos, serviços de proteção e práticas cotidianas. As políticas públicas foram ampliadas desde 2015, mas especialistas, organizações de mulheres e coletivos apontam lacunas persistentes: poucas unidades de acolhimento, demora na efetividade das medidas protetivas, subnotificação e falhas no registro que por vezes ocultam a real dimensão do problema. A consequência prática é que a sensação de impunidade incentiva a continuidade da barbárie, e a reprodução simbólica do controle sobre mulheres segue alimentando formas de violência menos visíveis, mas igualmente devastadoras.

Cultura: é mais tolerável do que a ideia de uma mulher livre

No tapete do Men of the Year da GQ Brasil, realizado em São Paulo na noite de 3 de dezembro de 2025, a atriz Bella Campos ( capa) — conhecida por trabalhos na televisão e por assumir presença ativa em debates sobre gênero e mídia — disse:

“O feminismo incomoda mais do que o feminicídio porque a ideia de uma mulher morta é mais tolerável do que a ideia de uma mulher livre”.

A frase foi compartilhada em redes e repercutiu entre coletivos e veículos porque nomeia, com dureza poética, um ponto central: a morte pode ser tolerada socialmente na medida em que preserva estruturas de dominação; a liberdade feminina, por contrariar essas estruturas, provoca resistência e incômodo. A fala circulou em posts e coberturas que registraram o momento e o seu alcance público.

Chamar o feminismo de incômodo é nomear um sintoma: algo que incomoda porque mostra uma ausência de negociação do poder. Perante o aumento dos feminicídios, as ruas convocam mais que protesto; convocam transformação — de leis, de práticas, de atenção. A voz de Bella Campos cortou o verniz da festa e apontou essa contradição. O que resta agora é traduzir incômodo em presença e presença em mudanças reais.

O chamado para as ruas: 7 de dezembro — Levante Mulheres Vivas

Diante da escalada de casos e da repercussão pública, o movimento Levante Mulheres Vivas convocou uma mobilização nacional para o domingo, 7 de dezembro de 2025, com atos em diversas cidades do país. A convocação pede: justiça pelas vítimas, políticas públicas efetivas, ampliação das redes de acolhimento, fiscalização das medidas protetivas e responsabilização dos agressores. Organizações sindicais, coletivos feministas e movimentos sociais uniram-se à chamada e reforçam que a ocupação das praças é também uma exigência por mudanças institucionais urgentes.

Lista atualizada de locais dos atos (por estado e cidade)

Abaixo, a relação consolidada das mobilizações confirmadas publicamente por organizadoras e veículos que acompanham o Levante Mulheres Vivas. Use-a como guia prático para comparecer, organizar-se ou divulgar; responsabilidade e segurança são prioridades — ver orientações ao final. (Fontes: perfis oficiais do movimento, portais de movimentos sociais e reportagens locais).

Região Norte

  • Pará — Belém: 6/12 — Boulevard da Gastronomia / horário a confirmar.
  • Amazonas — Manaus: 7/12 — Largo São Sebastião, 17h.

Região Nordeste

  • Maranhão — São Luís: 7/12 — Praça da Igreja do Carmo (Feirinha), 9h.
  • Piauí — Teresina: 7/12 — Praça Pedro II, 17h.
  • Piauí — Parnaíba: 7/12 — Em frente ao Parnaíba Shopping, 16h.
  • Ceará — Fortaleza: 7/12 — Estátua de Iracema Guardiã (Av. Beira Mar), 16h.
  • Bahia — Salvador: mobilização confirmada (algumas ações locais programadas para 14/12 em trechos da Barra); ver atualização local.

Região Centro-Oeste

  • Distrito Federal — Brasília: 7/12 — Feira da Torre de TV, atividades e leitura de manifestos.
  • Mato Grosso — Cuiabá: 6/12 — Praça Santos Dumont, 14h.
  • Mato Grosso do Sul — Campo Grande: 7/12 — Av. Afonso Pena (próximo ao Aquário), 13h.
  • Goiânia, Goiás – 07/12 na  Praça Universitária, às 15h.

Região Sudeste

  • São Paulo — Capital: 7/12 — Vão do MASP, 14h.
  • São Paulo — São José dos Campos: 7/12 — Largo São Benedito, 15h.
  • Rio de Janeiro — Rio: 7/12 — Posto 5, Copacabana, 12h.
  • Minas Gerais — Belo Horizonte: 7/12 — Praça Raul Soares, 11h.

Região Sul

  • Rio Grande do Sul — Porto Alegre: 6/12 — Praça da Matriz, 17h.
  • Paraná — Curitiba: 7/12 — Praça João Cândido (Largo da Ordem), 10h.
  • Santa Catarina — Florianópolis: 7/12 — Cabeceira da Ponte Hercílio Luz (lado Ilha), 13h.
  • Santa Catarina — Joinville: ato confirmado no sábado 6/12 em algumas agendas locais.

Orientações práticas e éticas para participar

1. Organize-se em grupo sempre que possível e combine pontos de encontro e saída.

2. Leve água, documento, carregador portátil e, se for seu hábito, máscara. Use roupas e material que facilitem a mobilidade e a visibilidade das mensagens.

3. Respeite a coordenação local — coletivos e brigadas organizadoras indicam rotas e abrigos.

4. Evite expor vítimas: não compartilhe fotos ou dados que comprometam a privacidade de pessoas atingidas.

5. Em caso de violência ou emergência, priorize a retirada segura do local e procure equipes de atendimento e primeiros socorros presentes.

Portal Raízes

As publicações do Portal Raízes são selecionadas com base no conhecimento empírico social e cientifico, e nos traços definidores da cultura e do comportamento psicossocial dos diferentes povos do mundo, especialmente os de língua portuguesa. Nossa missão é, acima de tudo, despertar o interesse e a reflexão sobre a fenomenologia social humana, bem como os seus conflitos interiores e exteriores. A marca Raízes Jornalismo Cultural foi fundada em maio de 2008 pelo jornalista Doracino Naves (17/01/1949 * 27/02/2017) e a romancista Clara Dawn.

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