O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma condição neurobiológica caracterizada por desatenção persistente, impulsividade e, em alguns casos, hiperatividade. Muito associado ao universo infantil, o TDAH, no entanto, não se restringe à infância: ele pode acompanhar a pessoa ao longo de toda a vida.

Quando não identificado cedo, o indivíduo tende a criar explicações dolorosas para seus desafios, como acreditar que é preguiçoso, incapaz ou desorganizado por falta de esforço. Esse autojulgamento, somado às dificuldades reais, pode gerar baixa autoestima, sofrimento emocional e uma rotina exaustiva, como se fosse preciso “matar um leão por dia” para dar conta do que para outros parece simples. O diagnóstico tardio, portanto, não é apenas um rótulo clínico, mas um divisor de águas: dá nome ao que parecia um fracasso pessoal e abre caminho para estratégias de cuidado, acolhimento e reorganização da vida.

“Aceitar o meu TDAH me fez parar de lutar contra mim mesma”

A psiquiatra e escritora Ana Beatriz Barbosa Silva, tornou-se uma referência no Brasil quando o assunto é TDAH. Mas antes de ser especialista, ela foi paciente. Durante a faculdade de medicina, aos 19 anos, ao participar de um seminário em Chicago, percebeu que a descrição do TDAH falava diretamente sobre si. Ali ela começou o caminho de sua própria descoberta diagnóstica.

Ela conta que até então convivia com impulsividade, desatenção e desorganização que dificultavam seus estudos e relações. Na época, recebeu de um dos maiores especialistas do mundo a confirmação de que tinha TDAH em grau grave. E ouviu uma frase que marcou sua vida: “Sobreviver, você já sobreviveu. Mas você mata um leão por dia”.

Ao compartilhar sua história, a Dra. Ana Beatriz humaniza o diagnóstico. Mostra que o TDAH não escolhe profissão, inteligência ou talento, e que assumir o transtorno não diminui sua autoridade médica. Pelo contrário: amplia a força do seu testemunho. Quando uma psiquiatra de renome assume publicamente que tem TDAH, que convive com impulsividade e que precisou buscar ajuda, abre-se um convite para que qualquer pessoa também possa se olhar com menos culpa e mais responsabilidade.

Se até a Dra. Ana Beatriz, que construiu uma trajetória brilhante, precisou enfrentar o impacto de um diagnóstico tardio, por que não você? Buscar compreensão não é sinal de fraqueza, é um gesto de coragem e autoconhecimento.

15 sintomas mais comuns do TDAH adulto

Baseado nas descrições dos vídeos e em materiais correlatos de Ana Beatriz Barbosa, aqui vão 15 sintomas do TDAH na vida adulta. Segundo a especialista, alguns sintomas podem variar de intensidade de pessoa para pessoa.

  1. Desatenção frequente: dificuldade de manter o foco em tarefas rotineiras, especialmente quando não estimulantes.
  2. Impulsividade: agir antes de pensar, tomar decisões precipitadas ou sem avaliar bem consequências.
  3. Inquietação mental: uma mente que “não para”, pensamentos rápidos, dificuldade de “desligar” a cabeça.
  4. Hiperatividade física, sensação ou impulso de estar “sempre em movimento”: mesmo que de forma interna ou moderada (não necessariamente correr/agitar-se como criança, mas percebe-se uma constante inquietação física ou psicoemocional).
  5. Desorganização: dificuldade de manter organização pessoal, rotinas, agenda, espaços físicos.
  6. Procrastinação: adiar tarefas, deixar para última hora, sensação de pressão quando o prazo está perto.
  7. Esquecimentos frequentes: compromissos, prazos, itens pessoais, esquecer onde guardou algo; estar no meio de uma conversa e devagar com algo que foi dito ou se distrair com qualquer coisa que passe por perto ou outro pensamento nada a ver.
  8. Dificuldade em iniciar ou completar tarefas: muitos começos, poucos finais; abandono de projetos no meio.
  9. Sensibilidade à frustração / emoções instáveis: irritabilidade, oscilações de humor, decepções mais dolorosas, baixa tolerância a contratempos e contradições.
  10. Dificuldade de planejar / gerenciar tempo: subestimar o tempo, atrasar-se, impossibilidade de estimar bem prazos.
  11. Baixa tolerância à monotonia / tarefas repetitivas ou que exigem persistência sem novidade: entediar-se fácil, não tolera o que não estimula o hiperfoco.
  12. Instabilidade nos relacionamentos interpessoais: desentendimentos por esquecimento, por impulsividade, pela dificuldade de ouvir ou manter atenção durante uma conversa ou pela falta de maturidade e inteligência emocional em lidar com situações conflitantes.
  13. Dificuldade de relaxar / desacelerar:  mente agitada mesmo em momentos de descanso; dificuldade para dormir, acorda cansado mesmo tendo dormido várias horas, porque a mente não desliga nem quando dorme.
  14. Baixa autoestima profissional, culpa ou vergonha associadas às “falhas repetidas”:  sentir que “deveria estar dando conta”, se cobrar muito, sentir-se fracassado em relação aos outros mesmo sendo competente.
  15. Hiperfoco ocasional/característica curiosa de quem tem TDAH: conseguir se concentrar intensamente em algo que é muito interessante para si, ignorando todo resto, mesmo que depois haja exaustão ou dificuldade para mudar o enfoque. (Embora nem sempre seja destacada, ela aparece em seus livros como parte do funcionamento típico)

Quem faz o diagnóstico de TDAH em adultos

O diagnóstico deve ser feito por médicos especialistas em saúde mental, principalmente:

  • Psiquiatras, que avaliam sintomas, histórico e comorbidades.
  • Neurologistas, em alguns casos, quando há necessidade de diferenciar de outros transtornos.
  • Psicólogos podem aplicar testes, escalas e fazer parte da avaliação, mas o diagnóstico clínico final é médico.

O processo inclui:

  • Entrevista clínica detalhada (história de vida, sintomas desde a infância, funcionamento atual).
  • Escalas de rastreio e questionários específicos.
  • Exclusão de outros transtornos que possam explicar os sintomas.

Como é feito o tratamento do TDAH em adultos

O tratamento é multidisciplinar e geralmente combina:

  1. Medicação

  • Estimulantes (como metilfenidato e lisdexanfetamina).
  • Não estimulantes em alguns casos.
  • Sempre prescritos e monitorados por um médico.
  1. Psicoterapia

  • Abordagens como terapia cognitivo-comportamental (TCC) ajudam no manejo da impulsividade, organização e autoestima.
  • Estratégias psicoeducativas para entender e lidar com o transtorno.
  1. Mudanças no estilo de vida

  • Rotinas mais estruturadas.
  • Exercícios físicos.
  • Técnicas de organização e mindfulness.
  1. Apoio psicossocial

  • Grupos de apoio.
  • Acompanhamento familiar e no trabalho, quando necessário.

Reconciliação com a própria história

Do ponto de vista psicanalítico, o diagnóstico tardio funciona como uma nomeação que reorganiza a narrativa de si. Antes, o sujeito vive na angústia de não compreender seu próprio modo de ser; depois, ganha uma chave simbólica que não elimina os sintomas, mas os resignifica. A impulsividade, antes vista apenas como falha moral, passa a ser compreendida como expressão de um funcionamento específico da mente.

Essa mudança abre espaço para um movimento de reparação subjetiva: a pessoa pode se perdoar, se acolher e buscar novos caminhos. Não se trata de reduzir-se ao diagnóstico, mas de incluí-lo como parte de uma identidade complexa, que pode ser cuidada e cultivada.

Em última instância, reconhecer o TDAH na vida adulta é um ato de reconciliação com a própria história: um gesto de amor-próprio que devolve ao indivíduo o direito de ser inteiro.

Fontes






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