Meu pai me contou que, quando era menino, no inicio do século passado, guardava os seus brinquedos num saco. Os brinquedos que o pai menino guardava no saco: latas vazias, pedaços de barbante, sementes, sabugos de milho, botões, pedaços de pau, pedrinhas e todo tipo de coisas inúteis. Quando alguém aparecia para visitar a minha avó, ele pegava o saco de brinquedos e o esvaziava diante da visita.

Certamente achava os seus brinquedos interessantíssimos! A mãe dele ficava furiosa e aplicava-lhe um corretivo de chineladas depois que a visita ia embora. A chinela era um dos itens favoritos que minha avó guardava no saco de brinquedos dela.

As crianças continuam as mesmas. Ainda gostam de mostrar brinquedos. A gente cresce e continua brincando. “Em todo homem há uma criança que deseja brincar” (Nietzsche). E todos temos o nosso saco de brinquedos. A fala somos nós abrindo o saco e depositando brinquedos…

O saco de brinquedos: isso é de fundamental importância quando o amor está em jogo. A paixão acontece quando, fascinados por uma imagem – pode ser um jeito de olhar, um jeito de sorrir, um jeito de falar! -, imaginamos que dentro daquele corpo de imagem fascinante estão guardados os brinquedos com que gostamos de brincar. O que vemos é a imagem da pessoa amada, mas o que imaginamos são os brinquedos que julgamos guardados dentro dela. Rubem Alves

Da redação de Portal Raízes.  Texto de Rubem Alves – Título original: saco de brinquedos – Excerto do livro “Pensamentos que penso quando não estou pensando” – Editora Papirus, Campinas, São Paulo, 2012. Se você gostou do texto, curta, compartilhe com os amigos, e não se esqueça de comentar. Pois isto contribui para que continuemos trazendo conteúdos incríveis para você. Siga o Portal Raízes também no FacebookYoutube e Instagram.






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