Mulher com deficiência contratou profissional para fazer sexo pela primeira vez aos 43 anos. Esta é a chamada de uma matéria veiculada pela BBC em 10 de maio de 2023 e conta a história de Melanie, que estampa a capa, vestida de cor-de-rosa, sorrindo em sua cadeira de rodas. O título é nocivo em muitos aspectos, porque expõe de maneira disfuncional a Pessoa Com Deficiência (PCD) e reforça estereótipos capacitistas, que é a  discriminação e o preconceito contra PCDs.

Entretanto, trouxe um bom debate às redes sociais: O direito à sexualidade e a não infantilização da pessoa com deficiência. A reportagem, que está em português, conta que Melanie, uma mulher que tem paralisia nas pernas e movimento limitado nos braços em decorrência da inflamação da medula espinhal, condição conhecida como mielite transversa, após o período de isolamento durante a pandemia de Covid19, decidiu contratar um profissional para fazer sexo com ela pela primeira vez.

Antes de contratar um profissional, Melanie não tinha ideia de como seu corpo reagiria quando tocado intimamente, se ela seria capaz de ficar em uma posição favorável ou se o cansaço impediria qualquer prazer.

“Essa foi a razão pela qual contratei Chayse. Eu não queria ir para casa com um cara de um bar e descobrir essas coisas e ficar desajeitada, vulnerável e insegura”, disse ela que depois disso descobriu que pode e deve se divertir bastante e não precisa se limitar.

Eu, enquanto pessoa com deficiência visual (PCDV), preciso dizer que fiquei espantada, mas não surpresa com o relato de Melanie. Espantada porque em função de uma característica de seu corpo, Melanie só foi ter sua iniciação sexual após os 40 anos. E estaria tudo bem se esse adiamento, digamos, do ato não estivesse ligado de maneira implícita à sua deficiência. É que corpos com deficiência, geralmente, não estão na linha de desejo de quem não tem deficiência. E isso porquê, apesar do desejo ser um instinto humano, algo inerente a nossa espécie, ele também pode ser direcionado.

Se um amigo ou amiga nos conta que está se interessando por alguém, não pensamos na possibilidade que este afeto de nosso amigo ou amiga talvez ande em uma cadeira de rodas, que não escute ou que utilize cão -guia. E isso porque a sociedade, através da infantilização, anula a sexualidade de quem tem ou adquire algum tipo de deficiência, esquecendo que também somos seres passíveis de vontades, fantasias, fetiches.

Como não é esperado de nós, PCDs, performances ligadas aos gêneros, como virilidade para o masculino e delicadeza para o feminino, por exemplo, é comum perceber que as pessoas adotem um certo “pudor” ao falarem sobre sexo perto de PCDS, ou de nos imaginar exercendo esse papel.

Texto de Juliana Santhele, jornalista PCDV, colunista do Portal Raízes e autora do livro
“Entre Vistas” sobre a maternidade sola na sociedade brasileira pós-moderna (Prelo).






Juliana Santhele é jornalista, jovem, negra, PCD. Colunista do Portal Raízes, ouvinte de podcast nas horas vagas, leitora do que chama a sua atenção. Autora do livro: "Entre Vistas" sobre a maternidade solo na sociedade brasileira pós-moderna (prelo).