A Poesia sempre esteve presente na vida das pessoas, na crônica de jornal, nas narrativas literárias, no cotidiano delas, basta que a entendamos como essência,  não se limita ao poema, que nem sempre a possui. Essencial ou não, ela estará sempre por aí, a encantar pessoas, a denunciar um estado de coisas. A poesia como poiesis, o fazer poético, ato de criação, para se  converter na aisthesis, fruição, requer aprendizado, persistência, reconhecimento, à maneira do amar, como quer o poeta: “amar se aprende amando”.

Nem sempre valorizada, ela, de vez em quando ganha algum status, é promovida, como foi o caso do poema “Lira Itabirana” (leia abaixo), publicado no Jornal Cometa Itabirano, em 1984, e republicado, agora, pelo jornal O Globo, a propósito do Crime Ambiental em Mariana. O poema chegou-me, enviado pelo amigo Luiz Rodrigues, Advogado Tributarista e intelectual alagoano (de Palmeiras dos Índios), via WhatsApp,  com a seguinte interrogação: “Profecia?”, Não! Respondi, após concluir a leitura.

 O Rio? É doce./A Vale? Amarga./Ai, antes fosse/Mais leve a carga.//

Entre estatais/E multinacionais,/Quantos ais!//

A dívida interna./A dívida externa/A dívida eterna.//

Quantas toneladas exportamos/De ferro?/Quantas lágrimas disfarçamos/Sem berro?//

O Poeta enxerga longe, para lá da superfície, das divisas comerciais. Premonitório? Não! Realista, esteticamente realista. O problema é que as pessoas, muitas delas, não se alimentam de poesia, valorizam a superfície, o noticiário econômico, a vida alheia, as novelas, a crise, mas são incapazes de se interessar pelo homem, seu semelhante, pela dor desse homem, muitas vezes captada pelas “antenas da raça”, até que algo grave aconteça e alguém iluminado resgate dos seus alfarrábios alguma história, alguma poesia, que de forma utilitarista responda à irrefletida massa.

Drummond não cantou o futuro, mas o presente, o seu tempo, sentiu a dor do seu povo, a desfaçatez dos poderosos, o desmantelo, a guerra, as mazelas sociais. Não estava vivo para ver a privatização da Vale do Rio Doce, a supressão do “doce” do nome da Vale, e, por último, a “morte” do Rio, um rio de “lama”, palavra que, certamente, seria o mote para um novo poema, mas o poeta não está mais aqui, e o que nos resta, além da lama, da destruição, do lastro de tristeza, que a mídia insiste em chamar de “Acidente Ambiental”, é a consciência de que a poesia, além da estética, é ética, que traz esperança:

Não serei o poeta de um mundo caduco./Também não cantarei o mundo futuro. /Estou preso à vida e olho meus companheiros./Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. /Entre eles, considero a enorme realidade. /O presente é tão grande, não nos afastemos./Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. //(…)O tempo é a minha matéria, do tempo presente, os homens presentes,/a vida presente.//

Ao fechar esta primária reflexão, ouço os rumores do meu tempo: Paris chora os seus/nossos mortos, e nós, exaustos de tanta dor, nos calamos com Pessoa: o cansaço de todas as hipóteses…

Por Francisco Perna Filho






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