A infantilização traz para esse público a ‘estigmatização’ de um grupo homogêneo e que segue um padrão de gostos, hábitos, atividades e que possuem as mesmas características, tão enfatizadas e divulgadas que os tornam sempre os ‘bons velhinhos’, ‘frágeis’, ‘bonzinhos’, ‘pobrezinhos’. Até o uso das palavras no diminutivo enfatizam ainda mais o poder da infantilização. É como se as experiências e capacidades cognitivas de um idoso fossem incompatíveis com as da vida adulta. Comparando-os assim, a uma criança da primeira infância.

Parece exagero mas acontece o tempo todo, é o que familiares e profissionais de saúde fazem com alguma frequência tratando idosos como crianças, não interessando escolhas e opiniões, não permitindo assim, que tenham autonomia e os excluindo de conversas e discussões importantes.

A infantilização coloca uma barreira entre o idoso e o mundo

A infantilização da pessoa idosa é um mal que pode fazer com que ela se sinta descriminado e tenha sua autoestima afetada severamente. Pela ótica da psicanálise, a infantilização é uma fonte de violência que gera traumas e conflitos perigosos, que, destruindo a autoconfiança, apressa o declínio geral do idoso. “A infantilização coloca uma barreira entre o idoso e o mundo, como se este estivesse regredindo em importância enquanto sujeito. Isso traz consequências drásticas à saúde física também”, explica Eloah Mestieri, psicanalista com experiência em bem-estar na terceira idade.

Esses são apenas alguns dos principais pontos que envolvem o que se entende como a infantilização do idoso. O termo está diretamente relacionado ao “ageismo (Tradução do termo em inglês ageism, que significa preconceito etário.)”, ou “idadismo”, identificado pelo gerontólogo Robert Butler (EUA), vencedor do Prêmio Pulitzer em 1976 pelo livro Why Survive: Being Old In America (Por que sobreviver: ser idoso nos EUA, em tradução livre), e que se configura pelo preconceito contra idosos.

Exemplos de infantilização do idoso:

  • Expressões no diminutivo (comidinha, roupinha, caminha)
  • Falar apenas com o acompanhante ou como se a pessoa idosa não estivesse presente
  • Não inserir a pessoa idosa em programas como shows, teatros, festas e viagens em família
  • Não comentar e conversar sobre temas da atualidade
  • Desconsiderar a opinião da pessoa idosa e o histórico dela em decisões como fazer festa de aniversário, usar determinados tipos de roupa e fazer atividades como uma dança, por exemplo. 

Os façam independentes

É perfeitamente possível ser afetuoso, empático em relação a pessoa idosa sem descaracterizar a sua identidade e a sua personalidade. “É preciso dissociar a ideia de que, para ser empático, você precisa ser engraçado e fofo com a pessoa idosa. Na verdade você precisa ser coerente e falar com uma linguagem que ela entenda, e isso só tem relação com a sua capacidade cognitiva, da sua escolaridade, do seu déficit auditivo ou visual e não pela sua idade”, diz a Valmari Cristina Aranha, psicóloga com especialidade em gerontologia.

A experiência com o assunto deve trazer alguns questionamentos, explica Denise Diniz, coordenadora do Setor de Gerenciamento de Estresse e Qualidade de Vida da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), “Quando se infantiliza o idoso, se está promovendo a autonomia ou a dependência dele? Muitas vezes a intenção de proteger o idoso pode ser um excesso de cuidado que tira a sua independência. A perda da autonomia afeta a autoestima, a autoconfiança e prejudica o desenvolvimento da pessoa.”

Depressão

O esforço de adaptação por parte do idoso em relação às mudanças na rotina e das próprias limitações cognitivas e motoras envolve aspectos físicos, psíquicos e sociais e podem ser um gatilho para a depressão.

É importante ressaltar que as pessoas reagem de forma diferente e não se deve creditar unicamente essas questões à depressão. Porém, o sentimento de impotência em poder gerir a própria vida e o bombardeio à autoconfiança e à dignidade, pela autodesvalorização que o tratamento infantilizado diretamente promove, vai minando o humor e a vontade de viver da pessoa.

Essa forma de tratamento não contribui em nada para o bem-estar do idoso, sua dignidade, saúde mental e física. Desencadeando assim, estados de tristeza e melancolia que podem acarretar sintomas de depressão e apressar a perda cognitiva, senilidade e todas as doenças físicas e mentais.

O resultado disso é uma maior predisposição para a debilidade senil e o Alzheimer, baixa no sistema imunológico de forma geral, possibilitando o surgimento de várias ouitras patologias. Explica a psicóloga Valmari Aranha: “Certamente um idoso frustrado, humilhado, que se sente destituído de sua capacidade como sujeito tende a ficar mais introspectivo, isolado, mais triste, e isso sim pode agravar quadros depressivos pré-existentes ou até o surgimento de um sentimento novo de depressão”.

A procura da autonomia 

Trata-se de uma questão de equilíbrio, cuidado e bom senso. As pesquisas e experiências sobre o assunto ressaltam a importância de não fazer pelo idoso aquilo que ele —ou ela— tem a capacidade de realizar por si mesmo.

Temos que os permitir ensinar e ajudar quando forem solicitados incentivando-os a lançarem-se em novos desafios. Ouvi-los com atenção aprendendo com eles, pois a experiência de um idoso é sempre valiosíssima. Estimula-lo a socialização com pessoas de várias faixas etárias também é fundamental.

“É preciso quebrar esse estigma de que todo idoso é alguém dependente, sem autonomia e que não tem direitos e deveres. Deve-se cada vez mais mostrar que a pessoa idosa tem um lugar e que o ocupa da melhor forma possível e que não está ali apenas esperando o fim, mas que ainda tem muito que viver, aprender e compartilhar com novas gerações” – explica Simone de Cássia Freitas Manzaro – Psicóloga formada pela Universidade Nove de Julho, Pós-graduada em Gerontologia. Aperfeiçoamento em Atenção Domiciliar. Capacitação em Saúde da Pessoa Idosa.

Uma questão de respeito

Os estudos sobre o cuidado com o idoso passam pela necessidade de clareza na transmissão das informações e, principalmente, pela questão do respeito pela pessoa. O envelhecimento é uma condição como qualquer outra da vida e não necessariamente ela deve trazer consigo essa ideia de regressão e de inabilidade. Mesmo sob cuidados, o idoso não deve se colocar – ou ser colocado – em uma posição de passividade.

E mesmo quando a pessoa não consegue mais expressar verbalmente as suas vontades, é importante que a família tenha um histórico sobre o perfil dela, os desejos dela em outros momentos da vida para saber trata-la em determinadas situações e decisões.

Nesse sentido, é bastante comum ouvir as pessoas falando até carinhosamente que os filhos viram ‘os pais dos pais’ na velhice. Na verdade, você pode virar um cuidador do seu pai, mas ele continua sendo seu pai. Mesmo debilitado ou sem condições de tomar algumas decisões, vocês tiveram uma história construída que pode te dar sustentação para que você consiga tomar as decisões por ele baseado nas informações de como ele construiu a história dele.

Ao infantilizar uma pessoa idosa estamos ocultamente praticando uma violência contra ela, que vai de desencontro ao Estatuto do Idoso quando diz “é obrigação da sociedade, família e Instituição assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na constituição e nas leis”.

Ao infantilizar a pessoa idosa criam-se alusões e falsos parâmetros acerca do processo de envelhecimento que pode determinar a forma como essas pessoas são e serão tratadas. Como você gostaria de ser tratado quando envelhecer? Pense nisso!

Fontes pesquisadas: Portal do Envelhecimento, Uol






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