Vereador gaúcho critica ação anti-assédio: “mulher decente não dá problema”

Neste sábado (9/03/2019), Maria Talita, neta de uma senhora de 101 anos de idade que foi estuprada pelo genro publicou um relato emocionante sobre a situação. O caso aconteceu na cidade de Pombos, na Zona da Mata de Pernambuco e foi descoberto após a esposa do homem instalar uma câmera no quarto.  

Vereador gaúcho critica ação anti-assédio

Mesmo diante de uma monstruosidade como esta onde fica muito evidente que a culpa não é da vítima, um vereador gaúcho gerou polêmica ao falar que “mulher que se presta não dá tanto problema”. A declaração foi do vereador Cláudio Gottschalk (PDT), de Nova Petrópolis (RS), ao final da sessão da última quinta-feira (7/03/2019), véspera do Dia Internacional da Mulher.

“Agora eu quero dizer uma coisa para vocês, falam tanto em mulheres, tantos problemas (…) uma mulher que se presta, uma mulher decente, não dá tanto problema. Uma mulher que se presta, eu acho que não dá tanto problema. O problema são as chinelonas”, disse Gottschalk, dirigindo-se à vereadora Kátia Zummach (PSDB), única representante feminina entre os 11 membros da Câmara municipal.

Se quiser ler a matéria completa sobre este vereador boçal, você a encontra completa no BOL. Aqui gostaríamos de prestar nossa solidariedade à essa senhorinha de 101 anos, à sua neta corajosa e aos familiares das 340 vítimas de violência contra mulher só no primeiro bimestre de 2019. O Brasil é o quinto país com maior índice de feminicídio do mundo. Mulheres de todas as idades, crianças, deficientes…

Até quando nós mulheres seremos culpadas pelos abusos sexuais, as agressões físicas e psicológicas e os estupros?

As consequências decorrentes do abuso sexual variam desde efeitos mínimos até problemas mais graves, com repercussões sociais, emocionais e/ou psiquiátricas – como Depressão, Transtornos de Ansiedade (entre os quais, o Transtorno de Estresse Pós-Traumático), Síndrome do Pânico, Transtornos Alimentares, Transtornos Dissociativos, Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade e, até mesmo, Transtorno da Personalidade Borderline. Também são descritas as manifestações de sintomas como: tristeza, ideação suicida, medo exagerado de adultos, comportamento sexual avançado para a idade, masturbação frequente e/ou pública, baixa autoestima, abuso de substâncias químicas, sonolência, enurese, encoprese, tiques e manias, isolamento social, dificuldades de aprendizagem, irritabilidade, entre outros.

Pesquisas epidemiológicas realizadas apontaram que 80% dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes são perpetrados no contexto doméstico, tendo duração mínima de um ano, sendo que esses abusos são denominados de intrafamiliares ou incestuosos, pois são praticados por pessoas próximas às vítimas.

Numa tentativa de compreender o fenômeno da violência intrafamiliar, autores observaram, entre os membros dessas famílias: relações hierarquicamente assimétricas caracterizadas por desigualdade e subordinação, que muitos abusadores já haviam sido vítimas de alguma forma de maus-tratos durante sua infância e/ou adolescência. E nos casos de violência doméstica, são observados desajustes familiares,  problemas psíquicos, alcoolismo,  aspectos sociais, econômicos e culturais. (Mas não se deve generalizar tais achados como uma relação direta de causa e efeito. Cada caso deve ser analisado distintamente).

Na dinâmica do abuso sexual, é comum que ocorra a retratação, a negação ou a dissociação, contribuindo para a perpetuação da violência por um longo período e impedindo a sua revelação, ou seja, fortalecendo a Síndrome de Segredo no Sistema Familiar. Muitas vezes a vítima tenta revelar a situação abusiva, sendo a revelação interpretada como imaginação ou mentira. Entretanto, pesquisas já comprovaram que é verdade que nem todas as denúncias de estupro são verdadeiras, mas é incontestável que a esmagadora maioria é. Uma pesquisa norte-americana que analisou dez anos de dados concluiu que 9 entre 10 relatos de estupro são verdadeiros. Aqui, não há nenhum estudo similar ao conduzido pelo especialista David Lisak nos Estados Unidos – mas a semelhança das dificuldades das sobreviventes para acessar a Justiça nos dois países permite uma aproximação. Lá, segundo Lisak, estima-se que no máximo 36% dos estupros são denunciados. Os percentuais são semelhantes no Brasil. Aqui, a notificação é de 35%, segundo estimativa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Onde denunciar?

No Brasil, o principal canal de denúncias de crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes é o Disque Denúncia Nacional, ou Disque 100. Qualquer assédio contra a mulher pode ser denunciado pelo número 180. A denúncia pode ser feita por telefone ou pessoalmente em alguma delegacia. Caso esteja diante de uma conduta de violência contra a mulher, faça registros (fotografe/filme) e ligue para a autoridade policial. Isso pode permitir que o criminoso seja pego em flagrante.

Fonte: Schaefer, L. S., Rosseto, S., & Kristensen, C. H. (2012). Perícia psicológica no abuso sexual de crianças e adolescentes. Psicologia: Teoria e Pesquisa

Clara Dawn

Clara Dawn é romancista, psicopedagoga, psicanalista, pesquisadora e palestrante com o tema: "A mente na infância e adolescência numa perspectiva preventiva aos transtornos mentais e ao suicídio na adolescência". É autora de 7 livros publicados, dentre eles, o romance "O Cortador de Hóstias", obra que tem como tema principal a pedofilia. Clara Dawn inclina sua narrativa à temas de relevância social. O racismo, a discriminação, a pedofilia, os conflitos existenciais e os emocionais estão sempre enlaçados em sua peculiar verve poética. Você encontra textos de Clara Dawn em claradawn.com; portalraizes.com Seus livros não são vendidos em livrarias. Pedidos pelo email: escritoraclaradawn@gmail.com

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