Condenada a 50 anos e 28 dias por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio duplamente qualificado, uso de documento falso e associação criminosa armada, a mãe de mais 50 filhos adotivos, a ex-deputada, a pastora e cantora gospel Flordelis dos Santos, 61 anos, protagoniza dois documentários sobre a sua a estarrecedora trajetória entre o céu e o inferno, na HBO Max com “Flordelis: Em Nome da Mãe” e no Globoplay com “Flordelis: Questiona ou Adora”.

Flordelis: Questiona ou Adora

“Ela foi do céu ao inferno como poucas pessoas foram”. Um dos primeiros depoimentos de Flordelis: Questiona ou Adora, nova série documental da Globoplay sobre a cantora, pastora e política brasileira Flordelis, ajuda a resumir bem a forma com que a imagem praticamente santificada da figura foi quebrada no fatídico 16 de junho de 2019, data em que seu marido, o pastor Anderson do Carmo, foi assassinado com 30 tiros na porta de casa da família.

Uma personagem fascinante por si só, Flordelis dos Santos de Souza mais parecia com uma heroína das favelas: desde os anos 1990, a imagem da moça era alimentada por meio de reportagens e aparições na televisão sobre suas ações sociais e outras benfeitorias pelo subúrbio carioca. Mas a partir desta semana, ela, juntamente a outros quatro suspeitos, enfrentam um julgamento por envolvimento na morte de Anderson.

A edição tenta montar, com capricho, um panorama imparcial tanto sobre a suspeita, como a da vítima: com depoimentos e entrevistas de amigos e familiares. Mas, do outro lado, a produção também apresenta jornalistas e policiais que acompanharam de perto o caso, mostrando um lado obscuro daquela que foi descrita como “a Ivete Sangalo das evangélicas”.

De origem humilde, Flordelis alimentou durante anos a imagem de mulher de família e da fé que abrigou moradores das favelas em sua casa, acolhendo e até mesmo adotando a todos – um deles Anderson, que futuramente se tornou seu esposo. Sendo mostrada como uma mulher em busca de curar os viciados e dar uma nova chance aos mais pobres, não demorou para que a evangélica passasse a ganhar espaço na mídia, tanto em matérias nos programas jornalísticos da emissora, como em aparições por outros programas. Sua imagem ganhou tanta credibilidade e força no Rio de Janeiro que Flordelis ganhou até mesmo um filme, Flordelis: Basta uma Palavra para Mudar, de Marco Antonio Ferraz e Anderson Corrêa. Uma produção em formato de docudrama, o título contou com inúmeros astros globais em pequenos papéis, como Isabel Fillardis, Pedro Neschling, Fernanda Lima, Bruna Marquezine, Reynaldo Gianecchini, entre outros.

Na produção, curiosamente, Flordelis interpreta a si mesma, mulher evangélica, moradora de favela carioca, e respeitada pelos traficantes. Anderson é vivido por Marcello Antony. Desde 2020, com a explosão do caso e o surgimento de evidências que passaram a ligar Flordelis ao crime, o próprio diretor e diversos outros membros do elenco declararam arrependimento de terem feito a produção. Esse fato isolado acaba falando mais sobre o caso em si do que o novo documentário da Globoplay. Sem nenhum depoimento chocante, nenhuma reviravolta guardada às sete chaves ou nada que torne o documentário obrigatório ou necessário, a produção, na verdade, mais parece com um pout pourri de todas as imagens disponível no acervo da emissora com Flordelis – e feito às pressas somente para aproveitar o julgamento da evangélica para tentar aumentar as visualizações e assinaturas da plataforma de streaming. (Crítica feita por Omelete) Assista o trailer logo abaixo:

Flordelis: Em Nome da Mãe

Flordelis: Em Nome da Mãe tem um diferencial que torna a obra da HBO muito mais atrativa: a presença de Flordelis narrando a própria história e guiando o telespectador através de sua perspectiva para desenhar os fatos que culminaram na morte do pastor Anderson.

Um detalhe que chama bastante a atenção no último episódio da obra é que, alegando inocência, a evangélica passou por uma preparação estética antes de ser presa. “Ela se preparou, chamou a clínica de uma amiga para aplicar botox nela. Ela falou que quando eu fosse visitá-la na prisão, ela queria que eu a visse bonita”, explica Allan Soares, atual namorado da ex-deputada no documentário da HBO Max.

“Tem que estar preparada para o pior. E o pior hoje, para mim, seria ir para a prisão, né? Então cuidemos do cabelo, para ser a Flordelis que eu sempre fui”, justificou ela.

Dirigida por Suemay Oran, Flordelis: Em Nome da Mãe apresenta imagens inéditas na casa da pastora, mostrando a rotina da família de dezenas de adotados, além de depoimentos com familiares da ex-deputada, pessoas que trabalhavam diretamente com ela, como sua advogada e sua assessora de imprensa, além de investigadores que atuaram no caso. O documentário ainda gravou a prisão de Flordelis em sua casa em agosto de 2021.

O olhar tão próximo, apesar de ser um grande saciador da curiosidade do público apaixonado pelo gênero true crime, leva ao questionamento se a produção da HBO Max não causa um enviesamento ao telespectador em determinados momentos dos quatro capítulos, gerando uma simpatia a Flordelis e o questionamento de se ela seria inocente, apesar de a Justiça ter julgado o contrário. Nesse quesito, por ter uma narrativa mais distante da religiosa, Flordelis: Questiona ou Adora soa mais imparcial, deixando o assinante do Globoplay mais a par dos detalhes das investigações do que da vida pessoal da protagonista, mostrada apenas por meio de imagens de arquivo.

Em entrevista a VEJA, Suemay Oran e o codiretor do documentário da HBO, Maurício Monteiro Filho, defendem que tentaram construir a obra da forma mais imparcial possível, mas que a proximidade com a pastora pode soar parcial. “Achamos que talvez o documentário pesasse mais do lado dela, porque tivemos mais tempo com ela, mas
tentamos equilibrar os dois lados, da acusação e da defesa, pelo nosso lado ético de jornalistas. Mas o maior objetivo foi contar essa história, então é possível ver como essa tragédia afetou a família inteira, às vezes não buscando quem é culpado ou não”, define a diretora. (Análise extraída de VEJA). Assista o trailer, logo abaixo:






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